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Legalize- A cantar memórias da infância, um dos grandes intérpretes da época de ouro da música angolana.Com o mundo imerso nas mudanças político-económicas dos anos 1970, as cabeças dos jovens fervilhavam e muitos usavam a música como forma de expor suas frustrações, injustiças sociais, amores roubados e, ou, simplesmente, darem ritmo ao quotidiano. Tanto que, em Angola, a década de setenta é igualmente conhecida como a “época de ouro” da música, o período no qual surgem grandes nomes do cenário musical angolano. “Na época dos melhores instrumentistas, como Duya, Marito, Constantino, Boto Trindade, percursionistas, Mangologo, Joãozinho Morgado, Massano Junior, Chico Monte Negro e depois vamos naqueles cantores como Teta Lando, Rui Mingas, Bonga, David Zé, Elias Dya Kimuezo e o grande Luís Visconde, autor do famoso “Chofer de Praça”, que muito jovem interpreta sem saber de quem é”, aponta Legalize, o cantor que, nesses tempos ainda menino, um dos grandes intérpretes de músicos daquela época, como António Paulino, Urbano de Castro, Minguito, que tocava acordeão, David Zé e por aí a fora. “Havia o Kutunoca, festas que se realizavam todas as semanas, de bairro em bairro. Quem organizava era o Luís Montez. Minhas irmãs iam e eu seguia para tentar ver. Desde tenra idade já interpretava essas músicas, não profissionalmente mas porque gostava. São músicas que me viram nascer”, conta. Natural do Rangel, Luanda, além da recordação das festas, António guarda ainda lembranças de tempos difíceis. “Havia muito tiro, muita guerra. Só me lembro que tínhamos que ficar debaixo da cama para escapar dos tiroteios”, recorda, frisando que nessa época já tinha mudado para o bairro do Mártires, onde a família vive há quarenta anos. “Sempre interpretei semba, mas sou muito fã de reggae” Tristezas à parte, seguindo a tendência do momento, em 1990 o jovem migrou para Portugal, mas os primeiros anos no país não foram nada fáceis. “Estava na moda, principalmente aqui no nosso bairro: todos os jovens queriam ir para Europa. Voltávamos com sapatos e roupas novas e isso ajudava a termos mais garotas ao nosso dispor. Mas não fui a pensar que havia de ficar lá muito tempo. Cheguei lá e a realidade era outra. Era trabalhar duro debaixo do frio e da chuva e para voltar era um problema porque o bilhete não era barato. E às vezes não tinha emprego. Aprendi algumas coisas, mas foi uma experiência muito dura”, relembra. Em solo português, António conta que trabalhou, e muito. “Fui ajudante de pedreiro, estive nos navios, lavei pratos nos restaurantes e fiz de tudo um pouco para comer”. Paralelamente a essa tentativa de sobrevivência, acabou por se tornar músico profissional. “Fui para a música por causa da minha mania de cantar. Sempre interpretei semba, mas sou muito fã de reggae, Bob Marley. Havia um movimento rasta em Portugal, que era o FankambaReggae. Eles descobriam talentos, e eu cantava com eles. A certa altura já não queriam que fizesse outra coisa”, diz. O início- A paixão pelo reggae era tamanha que o primeiro disco do cantor, lançado em 2003, ''Deus Vive'', é dedicado ao ritmo. “Foram nove composições em português e uma quimbumdo, que é uma versão da música Rumba Negra, de Urbano de Castro. Chamei-a ''Reggae Negro. A repercussão do primeiro álbum foi tão boa que levou o artista a países como Japão, Irlanda e, já de volta a Angola, participou, juntamente com outros artistas nacionais, na comemoração do Dia de África, em 2004. Antes de ser internacionalmente conhecido, António já havia adoptado o nome artístico Legalize, que, segundo o artista, veio na fase de imigrante, de 1990 até 2004. “Na altura não tínhamos documentos, estávamos clandestinos na Europa. Havia muitas manifestações para legalizarem os imigrantes. Uma amiga começou a chamar-me de Legalize. Aí o nome ficou”, explica. Já o segundo álbum, lançado em 2011, ''Mulundo'' – que em quimbundo significa montanha – veio com “músicas da terra”, como kizomba, semba e a rumba. Actualmente, Legalize prepara o terceiro álbum, ainda sem nome, mas seguirá o mesmo estilo do antecessor. Quanto à memória dos anos 70, as suas interpretações de grandes nomes da “época de ouro” da música angolana e internacional ajudaram-no a tornar-se conhecido. Foi um desses artistas, o brasileiro Martinho da Vila que, segundo Legalize, o estimulou indiretamente a escrever as primeiras composições: “Tinha uns nove anos e estava sentado com meu irmão na sala. O Martinho da Vila tinha passado por Luanda e deu algumas entrevistas. A maneira dele cantar me fez crer que era muito fácil, então comecei a escrever pela primeira vez. Ele veio cantar a Angola e transmitiu-me alguma coisa que dizia que aquilo era fácil”. Preconceito- Hoje, há muitos artistas que cantam em línguas nacionais e são bem recebidos pelo público, mas segundo Legalize, nem sempre foi assim. Companheiro de muitas notas - “No início fui muito desprezado. Eles estavam mais habituados a ver jovens a cantar em Inglês, enquanto fui buscar as músicas que esquecidas. Sou um dos pioneiros na busca desses valores que estavam praticamente esquecidos. Nem todos estiveram contra mim, alguns músicos eram contra, mas acho que deu certo porque hoje muitos estão a fazer. Espero que a nova geração siga o nosso exemplo para não esquecermos a nossa cultura”, finaliza...
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